Como diferenciar ortotanásia e eutanásia passiva?

Para que seja feita a distinção entre ortotanásia e eutanásia passiva, aqui referida em texto anterior, recorre-se normalmente à tentativa de distinguir os atos de abstenção e interrupção de tratamento médico, assim como a diferenciação entre tratamento comum e especial. Os autores da Bioética principialista, Beauchamp e Childress, apontam as fragilidades destas distinções, questão abordada em artigo científico escrito por Amanda Barbosa, apresentado e publicado no CONPEDI. Segue excerto abaixo. Boa leitura!

A distinção entre abstenção e interrupção não é clara. A interrupção também pode se dar por ato omissivo, como não colocar a infusão no tubo alimentar. Além disso, as duas condutas se confundem em tratamentos compostos por fases, pois a decisão de não iniciar a fase seguinte pode representar tanto a interrupção de um tratamento em andamento quanto a abstenção de se proceder a um tratamento em seu plano geral. Muitas vezes, somente após se iniciar o tratamento será possível chegar a um diagnóstico e prognóstico adequados e a avaliação dos custos-benefícios daquele.

Paradoxalmente, não propor ou permitir que se tente é moralmente pior do que não tentar. Não se admitir a interrupção de um tratamento que não é mais benéfico ou desejável pode conduzir à distanásia ou obstinação terapêutica, bem como à abreviação da vida, quando não se inicia um tratamento por se entender que ele não poderia ser suspenso. Por tudo isso, Beuchamp e Childress (2002, p. 219-220) acreditam que essa distinção é moralmente irrelevante, podendo gerar situações perigosas para os pacientes. Ambas as condutas podem ser justificadamente realizadas.

A segunda distinção a ser criticada é aquela entre tratamentos comuns e tratamentos especiais. Segundo a regra geral, os tratamentos especiais podem ser legitimamente rejeitados, enquanto os comuns não comportam essa possibilidade. A recusa dos primeiros significa deixar morrer, enquanto a recusa dos segundos é tida como homicídio ou suicídio. Para Beauchamp e Childress (2002, 221-224), essa distinção é vaga. Não é porque um tratamento é comum, habitual na práxis médica, que ele necessariamente deverá ser realizado, pois isso depende dos desejos do paciente e de sua condição geral.

Sendo comum ou extraordinário, fato é que qualquer tratamento pode ser benéfico ou prejudicial para o paciente, de modo que a análise se volta para uma questão de vantagens e desvantagens, de custos e benefícios. Portanto, também esta distinção seria moralmente irrelevante. Em substituição às distinções tradicionais por eles descartadas, é proposta a oposição entre tratamentos opcionais e tratamentos obrigatórios como forma de se refletir as políticas e práticas na saúde, cuja base está no direito à autonomia do paciente e numa análise da qualidade de vida.

 

Camila Vasconcelos & Amanda Barbosa

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